Ben & Jerry’s irrita israelenses ao parar de vender sorvetes em territórios palestinos ocupados

Fundada por dois empresários judeus e sediada no estado americano de Vermont, a marca de sorvetes Ben & Jerry’s estava muda nas redes sociais havia dois meses, após o recente surto de violência em Israel e Gaza. Eis que voltou em grande estilo, anunciando no Twitter nesta segunda-feira (19/7) a decisão de parar de vender seus produtos nos “territórios palestinos ocupados”, causando uma grande confusão, com críticas e ameaças de boicote. 

O movimento da empresa destoa do padrão adotado pela maioria das marcas globais, que preferem a neutralidade em temas políticos para não perder clientes. Mas, para a Ben & Jerry’s, o engajamento não foi novidade. Ela sempre fez o oposto, usando regularmente suas mídias para se posicionar em relação a questões sociais. 

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Defensores da causa palestina disseram que a empresa deveria ter ido mais longe, saindo inteiramente de Israel, apesar de o comunicado afirmar que o atual contrato com um fabricante local não será renovado. 

Atitude da marca gera reação no alto escalão político israelense

Mas o outro lado da disputa foi mais assertivo na reação, com manifestações vindas dos altos escalões políticos israelenses, de consumidores e de varejistas que discordam da posição. 

O ex-premiê Benjamin Netanyahu foi um dos primeiros a reagir, propondo um boicote dos israelenses à marca. 

O ministro das Relações Exteriores Yair Lapid, arquiteto da atual coalizão que governa o país, classificou a decisão de “rendição vergonhosa ao antissemitismo, ao BDS [campanha mundial por boicote econômico a Israel] e a tudo o que há de errado com [a militrância] anti-Israel e o discurso antijudaico.” 

Ele pediu aos estados americanos que tomem medidas contra a Ben and Jerry’s com base nas leis estaduais que proíbem contratos governamentais com entidades que boicotam Israel.

Segundo o jornal The Times of Israel, supermercados Kosher nos Estados Unidos estariam revendo seus estoques e cancelando contratos com a marca. 

Uma empresa engajada 

A Ben & Jerry’s foi adquirida em 2000 pelo conglomerado britânico Unilever, que ontem teve que se explicar. Em uma nota oficial, disse reconhecer que “o conflito israelense-palestino é uma situação muito complexa e sensível”, e que, como uma empresa global, suas marcas estão disponíveis em mais de 190 países, “com produtos essenciais que contribuem para saúde, bem-estar e diversão”. 

Ben Cohen e Jerry Greenfield, fundadores da marca de sorvetes Ben & Jerry’s. (Divulgação)

O comunicado afirma que a marca continua comprometida com a presença em Israel, e que, como parte do acordo de aquisição da Ben & Jerry’s, a Unilever reconhece o direito da marca e de seu Conselho independente de tomar decisões sobre sua missão social”. 

Os termos do acordo fazem jus à história da marca. Seus fundadores, Ben Cohen e Jerry Greenfield, amigos de infância, começaram a produzir sorvete em 1978, e sempre mantiveram uma postura ativa em temas como mudanças climáticas, racismo sistêmico, direitos LGBTQ, direitos de voto e a crise dos refugiados. 

A história da dupla deu origem a um livro publicado em 1994, Ben & Jerry’s: The Inside Scoop. A ideia foi mostrar como “como dois caras reais construíram um negócio com consciência social e senso de humor”

Diferentemente da maioria das empresas de produtos de consumo, ela mantém em suas redes sociais um perfil de ativismo, tuitando mais a respeito de situações distantes de seus negócios do que sobre os produtos. 

Marca tem perfil de Twitter ativo em questões políticas

Mas, até os produtos entram na conversa. Na era Trump, a empresa lançou o sabor Pecan Resist,que fez referência às divisões na sociedade que se aprofundaram durante o governo do republicano.  E não escondeu a intenção, afirmando que o lançamento era um apoio aos que lutavam contra a “agenda regressiva do Presidente Trump”. 

A invasão do Capitólio, em janeiro, também mereceu atenção. Em um post, a Ben & Jerry’s afirma que o que ocorrera no dia anterior não era um protesto, e sim “uma rebelião para apoiar a supremacia branca”. 

O racismo sempre esteve na pauta, bem como a violência policial. Neste post, a marca questiona os reais efeitos de uma decisão judicial de 1967, garantindo direitos iguais para estudantes negros. 

As mudanças climáticas não foram esquecidas pela Ben & Jerry’s, que elogiou o compromisso de redução de poluição anunciado pelo presidente Joe Biden. Mas pediu mais. 

A empresa se posiciona até sobre temas sensíveis para uma boa parte da sociedade conservadora americana, como a legalização da maconha. 

Ben & Jerry’s não irá renovar contrato com licenciado em Israel

Com essa trajetória, o silêncio da Ben & Jerry’s nas redes sociais justamente no momento em que os conflitos tomaram conta de Israel e de Gaza, há dois meses, causaram estranheza, a ponto de matérias em sites de notícias especializados tentarem adivinhar o que estava por trás da calmaria.

A empresa não explicou o motivo de ter esperado tanto para tomar posição. Uma das hipóteses é a de que poderia estar avaliando a situação jurídica ou mesmo validando com a Unilever o movimento feito há dois dias. 

Outra possibilidade, levantada pelo jornal americano The Boston Globe, seria o questionamento sobre a fábrica licenciada para um empresário local em Israel, que produz sorvetes no país e distribui para a região, incluindo os assentamentos israelenses na Cisjordânia e leste de Jerusalém. 

Durante os conflitos recentes, a marca foi questionada nas redes sociais. Comunicado emitido no dia 18/7 confirma que mudanças estão a caminho. O contrato anual não será renovado, e um novo esquema será anunciado

via: mediatalks.uol

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