Nesta quinta-feira (27/04), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Seccional do Ceará, realizou uma audiência pública para discutir a situação da segurança das escolas do estado. Com o tema “Escola Segura: políticas para segurança de crianças e adolescentes em ambiente escolar”, o evento reuniu integrantes de dez Comissões Temáticas da Ordem, autoridades municipais e estaduais, além de organizações não governamentais. Os representantes das instituições propuseram medidas efetivas de proteção aos estudantes e promoção da cultura de paz nos estabelecimentos de ensino públicos e particulares do Ceará.
Na ocasião, a OAB-CE anunciou a articulação para a criação de um comitê interinstitucional, que terá o Ministério Público como força motriz, para discutir a situação da segurança nas escolas públicas e privadas do Estado. Com foco na prevenção da violência no ambiente escolar, o colegiado congrega órgãos da Educação, Justiça e Segurança Pública. Integram o comitê: OAB Ceará, Ministério Público do Ceará (MPCE), Defensoria Pública do Ceará (DPE), Secretaria da Segurança Pública do Estado (SSPDS), Secretaria da Educação do Estado (Seduc), Secretaria de Educação de Fortaleza (SME).
A vice-presidente da OAB Seccional Ceará, Christiane Leitão, explicou que o comitê deverá realizar reuniões periódicas para promover um amplo debate, com olhares transversais, sobre os aspectos que podem desencadear comportamentos agressivos no âmbito escolar. “O comitê vai trabalhar juntando tanto o sistema de Justiça como os órgãos de educação e segurança, para que a gente possa atuar de forma perene, sempre com os olhos voltados para a prevenção, para a construção de uma escola de paz”, afirmou.
De acordo com Julianne Melo, integrante da Comissão da Criança e do adolescente da OAB Ceará, a audiência pública foi um pontapé inicial para as discussões coletivas que precisam acontecer dentro do comitê. “A ideia é que possamos formular propostas de políticas públicas para estimular a convivência pacífica entre alunos, professores e os responsáveis pelas crianças e adolescentes. Acredito que, através do diálogo franco e aberto, poderemos deliberar e apresentar, formalmente, ao Poder Público e às entidades que se dedicam à proteção do público infantojuvenil em Fortaleza e no interior do Estado”, declarou.
Em sua fala, durante a audiência pública, a presidente da Comissão de Educação e Cidadania da OAB Ceará, Sônia Cavalcante, destacou que estamos vivendo um retrocesso na educação e que é preciso retomar o progresso. “Educação se faz com amor e é através do amor, do diálogo, da conscientização da família e dos educadores que poderemos construir um mundo melhor. Vamos tentar, juntos, fazer algo para transformar a sociedade, a fim de que possamos ter uma educação livre de preconceitos, inclusiva e humanizada. Só assim, podemos transformar a educação em um lugar de paz e a escola em um lugar seguro”, declarou.
Sônia Cavalcante aproveitou a oportunidade para colocar a comissão à disposição das escolas para falar sobre bullying e ciberbullying, trabalho que já vem sendo realizado há algum tempo e que já alcançou centenas de estudantes.
Ricardo Madeiro, presidente da Comissão de Direito à Saúde da OAB Ceará, questionou a dificuldade para atendimento nos CAPS. Segundo ele, é preciso investir no cuidado adequado com a saúde mental de crianças e adolescentes que se encontram psicologicamente adoecidos, especialmente, nesse período pós-pandemia.
O presidente da Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência da OAB Ceará, Emerson Damasceno, destacou que a educação inclusiva é imprescindível e que a diversidade é aquilo que temos de mais precioso na nossa sociedade. “A educação passa por discutir, já no ensino fundamental, questões relacionadas aos direitos humanos”, afirmou.
Jovenil Oliveira, Secretário executivo dos Direitos Humanos do Ceará, nesse momento é fundamental reunir vários órgãos para dialogar sobre como fortalecer a cultura de paz dentro das escolas e na sociedade. ” Dentro da perspectiva dos direitos humanos, a nossa principal missão é a defesa da dignidade da pessoa humana. Na medida em que defendemos a dignidade da pessoa humana, nós também estamos defendendo segurança, direito à educação, atendimento de saúde quando necessário. Fortalecer a rede de apoio e atendimento dos serviços básicos é fundamental, porque isso também é uma linguagem da violência que a gente precisa encarar. Estamos sempre buscando fortalecer a prestação e a garantia desses serviços básicos que condizem com a dignidade humana.
Compartilhando iniciativas já encampadas no Estado do Amazonas, a vice-presidente da Comissão Direitos da Criança e do Adolescente no Conselho Nacional da OAB, Luiza Simonetti, explicou que está fazendo uma cooperação técnica com o Tribunal de Justiça do Amazonas, OAB e Grupo de Apoio à Adoção Bem Querer, para formatar um plano de atuação junto às escolas e famílias, para a formação da escola de paz. “Vamos formar um conselho com pais de crianças e adolescentes para que a gente possa trocar ideias sobre como dar acolhimento para que aqueles adolescentes que entrarem no sistema socioeducativo possam ser recebidos nas suas casas da melhor maneira possível. Já temos também o apoio da Seduc do Amazonas. Logo que o projeto piloto estiver estruturado, vamos multiplicar para outros estados que tenham interesse”, defendeu.
O coordenador do Centro Operacional da Infância do MPCE, Lucas Felipe Azevedo de Brito, afirmou que é preciso ‘atacar o problema pela raiz’, ampliando a preocupação para além da repressão policial. ‘O trabalho de inteligência e investigação é muito importante, mas precisamos mesmo é de uma rearquitetura das políticas públicas na Educação e Saúde, criando ações que efetivamente estimulem a cultura de paz nas escolas’, pontuou.
O promotor ressaltou ainda que, a curto prazo, eventuais comportamentos agressivos dos filhos podem ser contidos com atitudes simples dos pais. ‘Olhar a mochila, verificar o que as crianças estão portando antes de sair de casa, isso faz toda a diferença’. Outra conduta necessária, na opinião de Azevedo, é evitar o compartilhamento de vídeos, fotos ou relatos sobre possíveis episódios de violência. A ação, além de gerar pânico coletivo, pode incentivar novos ataques.
Representante do Sindicato dos Professores e Servidores Públicos do Ceará, Maurício Manuel, alertou para a necessidade de rever a remuneração dos professores e a estrutura das escolas. “Precisamos pensar em formas de financiamento para colocar em prática as ações que consideramos pertinentes dentro das escolas, junto à professores, alunos e para a melhoria da infraestrutura”, comentou.
Alexandro Viana, gerente da célula de mediação e cultural de paz da Secretaria de Educação de Fortaleza, falou sobre a importância de atuar de forma intersetorial para conseguir de fato encontrar soluções para as demandas enfrentadas no âmbito escolar. Ele destacou que tem trabalhado no sentido de ampliar a atuação da célula de mediação e cultura de paz nos equipamentos do município de Fortaleza para garantir maior capilaridade. “Temos cinco projetos em execução dentro do Pró-Paz, que é o programa da promoção da cultura de paz dentro das escolas. A ideia é promover ações preventivas, aproximar pais e filhos, garantir a formação dos profissionais e constituir núcleos de mediação dentro das escolas, com o objetivo de disseminar a cultura de paz”, explicou.
O secretário executivo da Secretaria de Segurança Pública do Ceará, cel. Márcio Oliveira, destacou que vem atuando, através de todas as suas vinculadas, unindo todos os esforços necessários para que possa contribuir para o fortalecimento da presença policial nas adjacências das escolas, com ações de inteligência e investigação. “A ideia é trabalharmos de mãos dadas com instituições parceiras para que a gente possa combater as notícias falsas e essa cultura da violência nas redes sociais. É uma diretriz do nosso secretário no sentido de aumentar a capacidade operacional, e com isso, levar uma sensação maior de segurança para as escolas e seus frequentadores”, concluiu.
Para o presidente da Comissão de Direito da Tecnologia da Informação da OAB-CE, João Araújo Monteiro, o uso indiscriminado das plataformas digitais pode estar por trás dos recentes episódios de violência nas escolas pelo País. “Sigiro que a educação digital seja incluída na grade curricular do ensino básico e defende um controle mais rigoroso sobre os conteúdos a que crianças e adolescentes são expostos nas redes sociais. A escola hoje não tem mais fronteiras com esse cenário digital. Precisamos desenvolver estratégias públicas para monitorar esses espaços”, sublinhou o promotor.
Pensando nessa mesma direção, a secretária executiva da Seduc, Oderlânia Leite, apontou que há urgência na necessidade de a Justiça estabelecer regras mais rigorosas no ambiente digital para garantir a ‘segurança tecnológica’ dos estudantes.
A recomendação também foi feita pelo representante do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Ceará (Sinep-CE), Lucieudo Ferreira. Ele defende um esforço coletivo para a constituição de um novo modelo de segurança nas escolas. “No momento, as escolas privadas apostam em palestras e programas intersetoriais como elementos estratégicos para tornar as unidades mais acolhedoras e resolver eventuais conflitos socioemocionais dos estudantes”, afirmou.
Para Christiane Leitão, a audiência pública foi um momento de profunda reflexão sobre o que precisa de fato ser feito para garantir a segurança nas escolas, bem como uma articulação para que todo o trabalho que vem sendo feito pelos órgãos públicos e entidades possam se comunicar. “A gente precisa pensar em políticas públicas de inclusão, no cuidado, no resguardo das escolas. A solução é só colocar polícia, precisamos realizar um trabalhar de forma integrada para que a gente possa trabalhar em ações concretas e possamos realizar um trabalho perene para a construção de uma escola de paz”, finalizou.